João Henrique e Bacelar possuem dívida de quase 60 milhões após condenação
João Henrique Carneiro e João Carlos Bacelar foram condenados em 2021 após uma auditoria do TCM apontar irregularidades e desvio de recursos em convênios da prefeitura com uma ONG
Foto: Reprodução
Dois anos depois de condenados pelo Tribunal de Contas dos Municípios (TCM), o ex-prefeito de Salvador, João Henrique Carneiro, e o deputado federal e ex-secretário de Educação, Cultura, Lazer e Turismo, João Carlos Bacelar (PV), ainda não quitaram as dívidas com a prefeitura. O valor que, inicialmente, era de R$47,7 milhões, acumula diariamente e já chega a R$57.809.287,87. O débito é cobrado pela Procuradoria Geral do Município (PGM). As informações são do g1
A dívida é referente à condenação do TCM que, em 2021, determinou que ambos deveriam devolver aos cofres públicos a quantia após uma auditoria apontar irregularidades e desvio de recursos em quatro convênios da prefeitura com a ONG Fundação Pierre Bourdieu, nos anos de 2011 e 2012, envolvendo recursos de cerca de R$115 milhões para ações educacionais.
Os envolvidos
João Henrique Carneiro foi prefeito de Salvador em duas gestões, 2004 a 2008, e reeleito para segundo mandato, de 2008 a 2012. Além da prefeitura, ocupou os cargos de vereador em Salvador, entre 1989 e 1994, e deputado estadual entre 1995 e 2004.
Em sua primeira eleição, obteve 74,69% dos votos válidos no segundo turno da capital baiana. Na reeleição, o percentual caiu pra 58,46%, também em segundo turno.
Em 2016, tentou outro mandato de vereador em Salvador, mas não foi eleito. Ele ainda foi candidato em 2018 ao governo da Bahia pelo PRTB, e ficou em quarto lugar com 0,58% dos votos.
João Carlos Bacelar Batista foi secretário de Educação, Cultura, Lazer e Turismo na segunda gestão de João Henrique em Salvador, entre 2010 e 2013. Desde 2015, é deputado federal.
Teve quatro mandatos de vereador (1993 - 2007) em Salvador e foi presidente da Câmara em 1995. Foi deputado estadual entre 2011 e 2015.
Relação com o TCM
O Tribunal de Contas dos Municípios (TCM) aprovou com ressalvas as contas dos anos da primeira gestão João Henrique à frente da prefeitura de Salvador.
Em 2015, as contas dos quatro últimos anos de governo foram rejeitadas pelo TCM. Também em 2015, o ex-prefeito foi condenado pelo TCM a devolver aos cofres municipais a quantia de R$ 5.178.344,42.
Como justificativa da cobrança, estavam gastos com publicidade de cunho autopromocional ou desacompanhados de provas, falta de comprovação de despesas, omissão na cobrança de multas, descumprimento de edital de concorrência, entre outros
Em 2022, os conselheiros do Tribunal de Contas dos Municípios da Bahia rejeitaram um Recurso Ordinário (RO) apresentado pelo ex-prefeito e pelo ex-secretário de Educação, Cultura, Lazer e Turismo. O RO é um requerimento de nova discussão a respeito da matéria tratada no processo.
Além de rejeitar o recurso e manter a decisão, os conselheiros multaram cada um dos ex-gestores em R$50 mil. O regimento interno do TCM admite, além do Recurso Ordinário, um pedido de reconsideração do julgamento. As defesas apresentaram esse pedido, que também foi negado.
O que dizem os citados
Ao g1, o deputado Bacelar disse que ainda não foi intimado no processo. "Estou aguardando a intimação e tomando as providências legais para ir à Justiça quando for necessário. Já constituí advogados e tenho a consciência tranquila de que sempre administrei os recursos públicos com a dignidade e austeridade necessárias".
Em nota ao g1, a defesa de João Henrique disse que pretende recorrer das condenações por entender que o ordenador das despesas foi o ex-secretário de educação e não o prefeito.
"Apresentaremos, perante o TCM, pedido de revisão, nos termos do Regimento Interno, do TCM, aduzindo, além da matéria inserida no recurso, a lei de nº 4.406/2022, que determina que é vedada a aplicação de multa pelo TCM, quando não comprovado o desvio de recursos em benefício próprio do gestor ou de familiares, e quando não comprovado que o gestor agiu com dolo no ordenamento de despesas (embora o ordenador tenha sido o ex-secretário de educação)".
Ainda na nota, a defesa do ex-prefeito diz que, caso o TCM envie os autos para execução fiscal, João Henrique ajuizará uma ação anulatória do caso. Segundo a defesa, "existe um processo judicial, já em curso (improbabilidade), onde o réu é o secretário de Educação e outros, sendo que o MP e Judiciário entenderam que o prefeito não responde por contratos, convênios, dívidas, etc, de secretarias onde sequer foi citado ou inserido na lide".
O g1 tentou ouvir a Pierre Bourdieu, mas não localizou responsáveis pela organização até a publicação desta reportagem.
Relembre o caso
Motivos da auditoria
A auditoria nos convênios foi instaurada pelo TCM após a constatação de que os repasses para a ONG apresentavam significativas diferenças entre os montantes declarados no Sistema SIGA, do tribunal, e os valores constantes da documentação das prestações de contas.
O órgão detalhou que, embora a soma dos recursos previstos para a execução dos quatro convênios fosse de R$ 115.964.476,93, foram encaminhados para análise do tribunal documentos relativos ao emprego de apenas R$ 33.913.135,99.
O relatório elaborado pelos auditores do TCM apontou a existência de diversas irregularidades e vícios na celebração e execução dos convênios, “além da patente falha e precariedade das prestações de contas”. Também chamou a atenção da equipe de auditoria a falta de acompanhamento e fiscalização da execução dos convênios por parte da Secult e, também, pela Controladoria Geral do Município.
O Tribunal de Contas dos Municípios revelou que o documento mostra que, entre os meses de junho e dezembro de 2012, foram contratados, em média, 1.382 profissionais para as atividades de “Analista, Coordenador de Recursos Humanos, Coordenador de Departamento Pessoal, Assistente Didático-pedagógico, Assistente A, Auxiliar de Desenvolvimento Infantil, Auxiliar de Secretária, Auxiliar de Serviços Gerais, Auxiliar de Apoio, Assistente de Manutenção, Motorista e Porteiro”.
Confira as ilegalidades apontadas pelo relatório:
- Direcionamento na escolha do conveniente para formalização dos instrumentos de cooperação técnica;
- Utilização incorreta do instrumento de convênio para a realização de cooperação técnica com uma Organização não Governamental;
- Ausência de documento comprobatório de notificação à Câmara Municipal relativo às celebrações dos Convênios;
- Ausência de documentos obrigatórios à celebração dos convênios;
- Fraudes na documentação fiscal de R$ 14.289.458,81;
- Comprovantes de despesas apresentados com irregularidades na Autorização para Impressão de Documentos Fiscais – AIDF;
- Contratação de pessoal, mesmo após a denúncia do convênio.
- Transferência de recursos financeiros à entidade, efetivada após a denúncia do convênio;
- Ausência de parecer técnico e de ação fiscalizadora por parte da Secult na execução dos convênios;
- Ausência de documentos essenciais para a composição das prestações de contas;
- Realização de despesas em desacordo com o previsto nos planos de trabalho;
- Divergência entre as informações constantes no CNPJ e em Notas Fiscais emitidas pelas empresas;
- Ausência de comprovação de despesas de R$ 12.934.741,11;
- Terceirização irregular de mão de obra de R$ 26.819.611,39;
- Desvio de função dos prestadores de serviços;
- Recibos de pagamento dos prestadores de serviços autônomos com dados incompletos;
- Burla à modalidade de procedimento licitatório;
- Ausência de segregação de funções na Coordenação e na Fiscalização dos Convênios;
- Utilização de recursos financeiros de um convênio para realização de despesas atinentes a outro;
- Ausência de parecer do controle interno; uso indevido de “verba indenizatória” para pagamento de pessoal contratado pela ONG;
- A não apresentação ao TCM de prestações de contas correspondentes ao montante dos valores efetivamente repassados à ONG.