476 anos de Salvador: Uma breve jornada pela história soteropolitana
A primeira capital do Brasil faz aniversário neste sábado (29)

Foto: Freepik
Salvador, a mais longeva capital do Brasil, a primeira cidade planejada do país, um polo cultural mundial, uma cidade marcada por lutas, resistência e fé. Muito além do acarajé e do Carnaval, Salvador é um local que pulsa história há 476 anos. Seja pelas construções imponentes, eventos marcantes ou personagens icônicos, o soteropolitano pode bater no peito e dizer: “eu sou barril, pai.”
O primeiro forasteiro
Nos tempos de escola, você deve ter ouvido falar no nome de Diogo Álvares Correia. Não lembrou? Acho que Caramuru é mais familiar. O fundador do município de Cachoeira também foi o primeiro lusitano a ter contato com os nativos que aqui viviam, lá em 1510. Seu nome vem da moreia, um animal similar ao peixe elétrico que, em tupinambá, se diz “caramuru”. O português construiu uma boa relação com os nativos e se casou com Paraguaçu, a filha do cacique da região.
A história do casal é melhor contada no poema épico “Caramuru: Poema Épico do Descobrimento da Bahia”, mas onde quero chegar é: Diogo Álvares foi peça importante para a fundação de Salvador, que viria anos mais tarde.
Capital da colônia
Lá em 1549, um tal de Tomé de Sousa veio a mando do rei de Portugal com a missão de fundar, povoar e fortificar a cidade de Salvador. O projeto foi baseado em uma concepção geométrica e racionalizada, inspirada no Renascimento.
O objetivo era criar uma fortaleza militar que servisse como centro administrativo para o Império português. Em um dia 29 de março, como este, cerca de mil homens desembarcaram para cumprir essa missão. O primeiro contato de Tomé foi com Caramuru, que já havia se estabelecido na região e sabia como e onde construir a cidade.
Durante a administração, o primeiro governador-geral do Brasil estimulou a agricultura, principalmente a cana-de-açúcar, e introduziu o gado bovino no Nordeste, trazido de Cabo Verde, colônia portuguesa no continente africano. Ele criou também o primeiro bispado no Brasil, em Salvador, e deu a base para a cidade ser, durante séculos, o principal entreposto comercial entre Portugal e as colônias.
Um passado sangrento e uma herança de resistência
Todavia, como estamos falando dos lusitanos no século XVI, é claro que precisamos falar da escravidão. Por mais cruel que ela tenha sido, a vinda dos africanos moldou não só a sociedade da época, mas também as próximas gerações que viriam. Estima-se que a Bahia recebeu mais de 1.2 milhão de escravizados e Salvador foi o segundo maior porto de desembarque de africanos nas Américas, atrás apenas do Rio de Janeiro.
Com tanta gente, não é surpresa que tiveram revoltas reivindicando condições melhores de vida, como a revolta dos Malês - que era um grupo de escravizados letrados vindos da Nigéria e buscava fundar uma república islâmica no Brasil - ou então a independência da região, como na Conjuração Baiana e no famoso 2 de Julho. A primeira, diferentemente da Inconfidência Mineira, foi um movimento de caráter popular em que se defendia a independência e igualdade racial, além de um governo republicano, democrático, com liberdades plenas.
O 2 de Julho foi, como os soteropolitanos gostam de reforçar, a verdadeira Independência do Brasil. O movimento tinha como objetivo expulsar os portugueses da Bahia e teve êxito. Este dia virou feriado no estado e é comemorado todos os anos com desfiles cívicos em Salvador, na Festa da Independência da Bahia. Além de nomes que foram imortalizados na história soteropolitana, como Major Antônio Maria da Silva Torres, Joana Angélica, Maria Quitéria, Corneteiro Lopes, entre outros. A luta pela Independência na Bahia veio antes da independência brasileira e só foi concretizada quase um ano depois do 7 de setembro de 1822.
Mas uma coisa era intrínseca em todas as revoltas: A abolição da escravidão. Vale lembrar que a Lei Áurea veio somente em 13 de maio de 1888. O passado de lutas e revoltas conferiu ao soteropolitano uma herança de resistência.
E hoje?
Salvador é uma cidade única. O sincretismo religioso entre o catolicismo e o candomblé está presente na vida dos soteropolitanos e fica ainda mais evidente nas tradicionais e centenárias festas de largo. Os festejos do Senhor do Bonfim que acontecem sempre em janeiro na capital baiana, assim como a festa de Santa Bárbara e Iemanjá, são um exemplo dessa união. Para Lara Chaves, 25, é estudante de comunicação na Universidade Federal da Bahia (UFBA) os costumes mistos de cada religião não ficam só nas celebrações:
“É algo que está intrínseco ao soteropolitano, faz parte da sua essência. A minha bisavó foi atravessada por isso, minha avó, minha mãe, eu também sou. Por esse dia a dia em que o sincretismo está sempre presente. Na sexta-feira você usa branco por causa de Oxalá, mas come moqueca porque não pode carne vermelha (costume católico). Qualquer lugar que você olha, tem uma igreja, mas qualquer lugar também tem um batuque trazendo essa essência africana e também a essência europeia. Somos uma mistura de tudo”, relata a estudante.
Os 476 anos da cidade representam muito mais do que o aniversário de uma antiga capital do país com praias paradisíacas e um carnaval gigante. São 476 anos de lutas e resistência de um município vivo, que pulsa cultura, arte e história. Parabéns, Salvador. Você é magnífica. Ou melhor, Salvador é massa! Botou pafudê, pai!